BRASÍLIA - O Supremo Tribunal Federal (STF) proibiu na tarde desta quinta-feira que partidos e candidatos em campanha recebam doações de empresas. Por oito votos a três, os ministros consideraram inconstitucional a legislação em vigor, que permite a doação de pessoas jurídicas até o limite de 2% do faturamento bruto do ano anterior ao das eleições. Ficaram mantidas as doações de pessoas físicas, em valor correspondente a até 10% dos rendimentos do ano anterior, e também o Fundo Partidário — que financia parte das atividades dos partidos com dinheiro público. A decisão tem validade imediata e será aplicada a partir de 2016, nas eleições municipais.
A decisão do STF sepulta as expectativas do Congresso de validar as doações de empresas nas eleições. A lei que permite esse tipo de financiamento de empresas foi aprovada pela Câmara dos Deputados na semana passada. Agora, a presidente Dilma Rousseff, pode vetar ou sancionar a lei. Se a lei for vetada, fica válida a decisão do STF.
“PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS"
Se for sancionada, a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) já está com ação pronta para ser ajuizada no STF, pedindo liminar para que a nova lei seja derrubada antes de 2 de outubro, um ano antes das eleições. Esse é o prazo que a Constituição dá para que uma nova regra eleitoral possa ser aplicada no pleito do ano seguinte. Nesta quinta-feira, apesar de o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ) ter defendido uma solução legislativa para retomar as doações de empresas, ministros do STF garantiram que uma nova lei será declarada inconstitucional.
— O julgamento do Supremo baseou-se em princípios constitucionais. Baseou-se no princípio da igualdade de armas, no princípio da isonomia, no princípio da democracia, no princípio republicano, na normalidade das eleições. Então, qualquer lei que venha possivelmente a ser sancionada, ou aprovada futuramente, e que colida com esses princípios aos quais o Supremo se reportou, e com base nos quais considerou inconstitucional doação de pessoas jurídicas para campanhas políticas, evidentemente terá o mesmo destino — explicou o presidente do STF, ministro Ricardo Lewandowski.
Luiz Fux, relator do processo movido pela OAB, concordou com o colega:
— O STF reconheceu a invalidade de doação de pessoa jurídica para campanha eleitoral. Então, qualquer iniciativa que viole essa decisão é considerada um atentado à dignidade da jurisdição. A lei (nova) vai ter o mesmo destino que teve essa. Se o Executivo sancionar, no meu modo de ver o caminho será o mesmo. Essa lei já traz em si o germe da inconstitucionalidade.
Fux deu a entender que, mesmo que o Congresso promulgue emenda constitucional, ela será derrubada no STF.
— Só relembro que o STF já declarou a inconstitucionalidade de emendas constitucionais. Eu relembro a última, que foi a dos precatórios — declarou.
O julgamento sobre a doação de empresas começou em 2013 e foi fatiado em quatro sessões. Votaram pela proibição das contribuições financeiras de pessoas jurídicas Luiz Fux, Joaquim Barbosa, atualmente aposentado; Dias Toffoli; Luís Roberto Barroso; Marco Aurélio Mello; Ricardo Lewandowski; Rosa Weber e Cármen Lúcia. Defenderam a legalidade das doações de empresas Teori Zavascki, Gilmar Mendes e Celso de Mello.
A OAB também questionava a regra que autoriza pessoas físicas a doar até 10% de seus rendimentos. Para a ordem, era preciso limitar um valor numérico como teto das contribuições de pessoas naturais, e não um percentual. Mas o STF manteve a regra atual.
O primeiro a se manifestar ontem foi Teori Zavascki, que resolveu fazer ajustes ao voto proferido anteriormente. Ele era totalmente a favor do financiamento de campanha por empresas. Ontem, estabeleceu condições para as doações. Para ele, deveriam ser proibidas de financiar campanhas pessoas jurídicas que mantiverem contratos com a administração pública. Ele também é contra a doação de empresas a candidatos que competem entre si.
Gilmar Mendes e Celso de Mello, que também são totalmente favoráveis às doações de empresas, concordaram com Zavascki. Para esses três ministros, não há proibição expressa na Constituição para a prática. Além disso, proibir a contribuição de empresas não diminuiria a corrupção nas eleições, porque seriam encontradas formas para burlar a lei. Um exemplo seria o partido receber dinheiro por caixa dois.
Rosa Weber e Cármen Lúcia defenderam proibir as doações por empresas.
— A influência do poder econômico culmina por transformar o processo eleitoral em jogo político de cartas marcadas, odiosa pantomima que faz do eleitor um fantoche, esboroando a um só tempo a cidadania, a democracia e a soberania popular — disse Rosa.
Venceu o argumento de que, pela Constituição, cabe aos cidadãos eleger seus governantes, e não a empresas. Portanto, pessoas jurídicas não teriam o direito de participar do processo eleitoral. A maioria dos ministros também afirmou que, sem poderem doar, as pessoas jurídicas deixam de ter tanta influência nas decisões políticas do país. Em tom irônico, Gilmar Mendes, que anteontem criticou duramente o PT pelos desvios na Petrobras, criticou a decisão:
— As empresas não amam, mas elas empregam as pessoas, permitem que elas amem, permite que elas tenham um emprego. As empresas não podem opinar (nas eleições)? Ora!
Ao fim do julgamento, os ministros consideraram desnecessário modular os efeitos da decisão — ou seja, declarar se ela tem efeitos imediatos. Antes, havia uma proposta de que o STF desse um prazo para o Congresso legislar.
Contrariado com a derrota, Gilmar anunciou que iria embora nessa parte da sessão, para tentar adiar a discussão para a próxima semana. Disse que tinha um compromisso. Lewandowski foi enfático ao dizer que a discussão terminaria naquele momento e não haveria possibilidade de reabrir o julgamento depois. O presidente do tribunal argumentou que a sessão foi marcada com antecedência e, por isso, não havia motivo para adiar o fim das discussões.
Após o julgamento, Fux disse que barrar as doações de empresas é incentivo ao caixa dois, como alertou Gilmar em seu voto, na quarta-feira:
— O sistema atual revela o quão arriscado é fazer um caixa dois e ser descoberto depois. Acho que há um desestímulo. Nas audiências públicas (realizadas no STF antes do julgamento), nós tivemos a informação de que tudo que as empresas querem é se ver livres dessa contribuição.
fonte: oglobo.com.br
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